Por Maria Eduarda do Nascimento
Na última sexta (11), aconteceu a peça "O Ogroleto" no Teatro Ipanema e nós, os "observadores FIL", entrevistamos os atores e o diretor para sabermos mais sobre a peça, além de pessoas da plateia que puderam passar suas impressões.
Primeiro falamos com os atores Nelson Albuquerque, que faz o Ogroleto, e Silvianne Lima, que interpreta a mãe.
Como vocês chegaram no Ogroleto?
Nelson: Na verdade, a gente teve dois encontros com o Ogroleto, um com o Miguel, lá em Fortaleza, ele foi dar uma oficina e apresentar alguns textos, trouxe o Ogroleto e a gente fez uma leitura, um estudo do que pode ou não falar para crianças. O outro encontro foi com Karen, ela foi lá falar desse texto, foi uma oficina de dramaturgia para teatro infantil. A gente também teve outro contato e então a gente convidou o Miguel para dirigir, tiveram idas e vindas em Fortaleza, vindas aqui (Rio de Janeiro). Em 2015 a gente fez uma pré-estreia e em 2016 a gente estreia o Ogroleto.
Qual foi o desenvolvimento como ator pro papel de Ogroleto?
Nelson: A gente ficou entendendo a criança, voltado para esse universo, compreender como ele acontece, se desenvolve. Esse estudo do que era esse menino-ogro, pra ele poder ter esses traços de ogro e ora de criança. Então a gente foi pesquisando na sala, experimentando, observando crianças, vendo filmes pra gente "sacar" um pouco como era o personagem. Como que ele poderia ter esse tamanho, ser grande e não ser um adulto, e ter o olhar da criança. Está muito na questão do olhar. E fomos experimentando, experimentando e chegou nesse.
E o objetivo, o que vocês pretendem levar para as crianças?
Nelson: Falar sobre essas diferenças. Geralmente é diferente porque usa óculos ou porque é gordinho ou porque é negro ou porque o cabelo é "daquele jeito". Mostra que todo mundo é um pouco ogro. Tem essa coisa das primeiras vezes serem sempre muito difíceis. Então é isso, é falar de ser diferente, de "tá" junto, de ser aceito. Ele não deixou de ser ogro, no final é isso, ele não deixa de ser ogro, mas aprende a conviver.
Você sempre trabalhou mais com peças infantis?
Nelson: É um pouco dividido, o grupo tem cinco espetáculos, dois infantis e três adultos.
E você prefere fazer qual?
Nelson: Criança é bacana, porque é uma responsabilidade maior de dialogar, de comunicar, de não deixar duplo sentido. Elas também respondem mais sinceras se gostam, dá pra ver a animação.
Como foi fazer uma mulher apaixonada por um ogro?
Silvianne: O espetáculo Ogroleto é bem especial para a gente, porque é o primeiro infantil que a gente fez com um diretor convidado. Uma dramaturgia que veio da Suzane Lebeau, uma dramaturga canadense. Então, foi um desafio para a gente fazer esse espetáculo, que começa diferente dos outros processos que costumávamos fazer, geralmente a gente fazia adaptando um livro ou partindo de algum conto e coisas mais brasileiras. E esse desafio de serem dois atores em cena, muito texto e tocar nesses assuntos para crianças que são assuntos que parece que não pode se falar com criança.
Quando a gente leu o texto pela primeira vez foi "como assim isso é pra criança?", mas a gente fez um bom estudo de mesa e juntou com o Miguel, que embarcou nessa loucura. E essa personagem, a mãe, essa figura de mãe que não é uma dessas tradicionais, até porque, primeiro, é uma "mãe solteira", entre aspas pois a gente sabe que o pai fica rondando a floresta. Mas essa mãe que tem tanto amor pelo filho que fica doentio, nesse sentido de proteger ele demais, proteger ele da natureza dele.
Foi muito bacana o desafio de construção de cena, de personagem, de estudo de mesa. Trazer essa figura que consegue dialogar com a criança trazendo esse limiar de que mãe é tanto amor que sufoca, mas ao mesmo tempo ela foi capaz de amar um ogro, então, ela sabe que esse Ogroleto está por vir. Está na própria criança, todo mundo é um pouco ogro de alguma forma no dia a dia, excluído, diferente de alguma forma. É muito bacana o que a Suzane escreve no texto não desvendando todos os segredos, mas mostrando bem essa trajetória da mãe, que começa com o filho bem mais crianção e como ele vai se desenvolvendo.
Ele começa a questionar a mãe, tem até a própria sexualidade, que vai florescendo, ele começa a se apaixonar pela Pamela. É muito legal mostrar essa mãe que sozinha dentro de uma floresta isolada de todo mundo, porque ela decidiu se isolar por amor ao filho e ao Simão, consegue educar essa criança e não podar totalmente o instinto dela. Tem muita gente que diz: "ela não quer que ele seja ogro, não quer que ele se desenvolva", eu acho que ela em algum momento sabe que ele vai desenvolver, ela só quer que ele vá aos poucos entendendo esse processo, até pra saber lidar com essa natureza dele dentro de uma sociedade que é tão preconceituosa. Então, a gente acaba falando dos dias de hoje, é como você falar para uma criança na escola sobre essas questões de gênero, por exemplo, com certeza tem crianças que sabem da sua sexualidade e não conseguem conversar com a mãe nem com a professora sobre isso e se sentem excluídas na sala de aula, ou uma criança negra numa sala de aula que é basicamente 90% branca.
Então, a gente traz essa história mística, esse universo da floresta, essas figuras mais élficas, mas pra tratar de assuntos que são o hoje. Eu acho O Ogroleto uma obra muito importante nesse sentido e a gente consegue chegar tanto na criança, que embarca na aventura desse menino e, como eu acho, a gente dialoga muito com as mães, por conta dessa figura materna, elas se veem muito ali nesse desafio. Algumas mães já me deram uns retornos.
Teve alguma previsão do que seria a mãe?
Silvianne: No começo, a gente foi muito pra uma mãe muito carinhosa, a gente investigava muito esse carinho ao extremo e depois a gente foi dosando.Em umas cenas ela não é tão carinhosa, investigávamos esse outro lado, uma mãe mais desiludida da vida, que está abandonada. Íamos pro outro extremo até tentar encontrar esse meio termo. E eu e Nelson, a gente tem esse jogo de cena bacana, a gente fez muito estudo e conversamos para conseguir tornar o texto mais natural na nossa boca e isso ajudou. Mas foi muito isso, a investigação dessa relação, investigar esse universo isolado, "como é uma mãe que está isolada de tudo?" Ela não conhece ninguém além do filho. Por exemplo, tem uma figura importante na peça que é a professora, que ela também é cúmplice. Ela fica mandando cartas, ela sabe o que está acontecendo, a professora não é boba, ela sabe que em algum momento esse ogro vai aflorar. Foi bem bacana, acho que teve um processo de quatro anos, então, O Ogroleto já fez muita apresentação. Hoje em dia a gente já faz brincando. É bom também quando o espetáculo chega nesse ponto que a gente sabe como atingir a plateia, já sabe o que vai dar. Foi isso, muito estudo. Depois falamos com o diretor, Miguel Vellinho.
Como foi o desenvolvimento, quais foram os desafios e como chegaram no Ogroleto?
Miguel: Eu já conhecia esse espetáculo a partir da montagem da Karen e me apaixonei por esse texto perdidamente. Em 2013, fui convidado pra participar de uma oficina em Fortaleza e a gente se conheceu. Nessa oficina eu tinha proposto um jogo com um trecho dessa peça e eles também ficaram arrebatados pelo texto. Foram quase dois anos de processo, porque eu não podia ficar lá, então esse espetáculo foi montado aos pouquinhos. Mas Eles também vieram ao Rio. A gente ensaiava ora em Fortaleza ora no Rio de Janeiro e levamos alguns bons meses nesse processo, até mais de um ano. Preparando coisinha por coisinha. E foi incrível, assim, eu me vi cearense, foi uma transformação porque foi muito legal. A gente tem outro projeto para o ano que vem. Agora tendo uma companhia no Ceará também. Foi muito bom.
Teve outro desafio além da distância?
Miguel: Muitos, muitos. Fora do grande centro Rio-São Paulo, as questões de cenografia, de cenotécnica, são muito deficitárias, então, esse palco giratório foi uma pedreira, porque não tem um pessoal de contrarregragem, pessoas absolutamente dedicadas a questão teatral. A gente foi muito na tentativa e erro até a gente conseguir fazer um cenário que girasse para os dois lados, tanto o centro quanto a periferia. E toda a dinâmica do espetáculo está dentro dessa estrutura que eu briguei muito pra ela existir, foi muito difícil por essas questões de não qualificação de profissionais fora do eixo Rio-São Paulo. Então isso foi uma grande pedreira, esse cenário pra fazer acontecer ele passou por vários protótipos e nunca dava certo, ele saía do eixo ou ele travava. Pra dominar isso foi muito difícil, mas eles conseguiram depois de muita tentativa e erro. Mas se a gente montasse no Rio não teria várias tentativas, seria mais certeiro, porque aqui na cidade tem muita gente trabalhando com cenografia especificamente. Então, todas essas questões rotatórias e também pensar num cenário que pode ser transportado por todo o país porque esse espetáculo acabou rodando por muitas cidades. Foi uma grande pedreira. O texto da Lebeau, foi bacana a absorção e foi tranquilo, porque a gente teve muito mais tempo pra depurar e achar os tons corretos e achar os momentos das viradas dentro da peça, acho que tudo isso foi tranquilo.
Então a adaptação do texto foi tranquila?
Miguel: Foi super tranquilo. Claro que a gente se pergunta se esse texto vai chegar legal nas crianças. É uma questão, porque o texto é forte, mexe em lugares muito sombrios ainda, então, sempre tinha essa dúvida "o que é esse espetáculo fora do conceito mais conhecido?". Eu mesmo me surpreendi com a qualidade do público de Fortaleza. O espetáculo foi muito bem recebido lá e tem sido recebido em todos os lugares onde ele vai. Então, acho que ele tem uma força e uma potência e vai tudo junto, vai a interpretação dos atores, todo mundo consegue decolar junto.
Por fim entrevistamos dois alunos da escola Andre Maurois, Pedro de 17 anos e Paulo Victor de 16 anos.
Quais eram suas expectativas para a peça?
Pedro: A minha particularmente era alta. Eu não conhecia muito da peça, só depois que a professora falou na sala que viríamos ver a peça e aí fui ler mais sobre.
Paulo Victor: Eu já sabia mais ou menos da história, porque quando a professora falou sobre a peça eu pesquisei na internet. Já criei uma expectativa boa e foi cumprida.
Quais foram as impressões de vocês sobre a peça?
Paulo Victor: No primeiro momento, eu achei muita maluquice, depois comecei a gostar e no final foi muito maneiro.
Pedro: Foi boa. Eu achei meio devagar no começo, não estava pegando muito bem, mas depois fui pegando e achei interessante.
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